quinta-feira, agosto 19, 2010

dom salvador (I)




Ainda a madrugada riscava o céu

quando D. salvador

envolto por denso nevoeiro sebastiânico

chegou.

Acredita ser cavaleiro andante

mas não transporta em si

os sonhos de lutar contra moinhos de vento e gigantes

não tem uma Dulcineia,

uma musa, uma inspiração

na escalada de montanhas

na travessia de desertos

ou no cruzar dos mares.



Sem calor e sem amor

vive na escuridão

rasga o vento e o tempo

com pesadelos e delírios

perde o juízo

entende ser o salvador

da república verbal

herdeiro da caixa de Pandora.



Sem moral e sem pudor

nesta intensa verborreia

despreza a memória de seu pai

e corrói o cordão umbilical.



Eis a antítese de D. Quixote!



D. salvador de tez pálida

tronco curvado

falando rispidamente

ou de sorriso sem nexo

ou chorando a vida

perdida que não soube viver

inferno do qual não se liberta

revelando a intolerância dos falsos profetas.

Como águia devoradora do imortal e regenerador fígado

o seu tormento prolonga-se.

Quem o salvará? Sabará?



dom salvador (II)



D. salvador regressou novamente

Novamente regressou a tragédia em pessoa

Trouxe com ele a grande inércia



Palmas para D. salvador

Palmas pela sua pestilenta contribuição

Palmas pela sua repugnante forma

em causar desgraça à vida alheia



O público que fique de pé

Aplauda copiosamente e com ânimo

aquele que, com soberba ridícula

vocifera do fundo da sua cova:

Eu construí! Eu destruí!



Que a Lua se apague

Que as Estrelas se escondam

Excepto o Sol

O grande astro

Iluminará o umbigo de D. salvador

O magnata obsessivo-paranóico da demolição.



Palmas, D. salvador regressou novamente!

quarta-feira, agosto 04, 2010

Cinza + eiro

Para o meu querido cinzeiro




Neste final do mês de Julho

solarengo e quente

encontrei um cinzeiro

Não tinha beatas

Nem cinzas

Não tinha, elegantemente,

um cigarro acesso na sua ourela.



Continha só e apenas

uma chave, agrafos

e alguns pedaços de papel em branco!



O meu peito de espanto se apartou

de tão vil uso

porque neste covil

Meu cinzeiro não viverá.



João Mariano