Se a lua
estendesse o seu véu
a noite e o silêncio acordavam.
Se fosse só a noite
o céu azul rodopiava
nas linhas traçadas pelo vento…
Todavia
prolongam-se as horas.
Colada a uma porta
anoitece Madalena
e o seu sorriso adormece
sem cantiga de embalar.
Se fosse só o silêncio
a noite renasceria
nas asas da cigarra.
Porém
os céus foram abandonados
e o luar um manto secreto
para um choro sentido.
Agora
Madalena
espera e desespera:
os deuses partiram como mendigos
à procura de novas invenções.
Afinal o mundo
é para ser despido
entregando-se a santidade da nudez
à feição fria de um afecto.
II
Não me interroguem
Não me interroguem
sobre a unidade da alma humana
Que unidade tem o átomo?
Resguardo a memória de ventos e marés
e permaneço atento à química dos meus pés.
Qual o sentido dinâmico da morte
se somos estranhos ao movimento dos astros?
Meta-morfose em plena luz do dia
Eis-me aqui
estranhamente em terras que luzem.
Diluído na noite,
porque há quem esteja pronto
para iludir-nos com as virtudes da civilização,
vagueio por entre ângulos rectos
e se não os transcendo
é porque tudo é certo e rectilíneo.
III
Morte numa tarde de Inverno
Filipe morreu
morreu
numa tarde de Inverno.
Em desespero Filipe viveu.
Pensamento inquieto
em desatento contratempo
lutando contra vento e mar.
Agora
diante do desespero da morte
choram a tua angústia:
esse estado de ser
diluto em noites de embriaguez
de onde nada se exala
para além de uma esperança perdida.
Filipe não morreu de morte morrida
Filipe enforcou-se com uma corda.
Morreu um homem!
Todos choram
o que poderiam ter feito por ti.
Já é tarde
e as lágrimas não comovem
o negro anjo.
Filipe acordou de um pesadelo
morreu para um sonho
e este tumultuoso Inverno vagamente vai passando.
IV
Lençóis brancos
Sobre as ondas do mar
sopram ventos
cantando melodias de outros tempos.
Sobre as ondas do mar
flutuam horizontes vindouros
em teus olhos nocturnos.
Na bruma da madrugada
voam lentamente lençóis brancos…
As marés partiram
as ondas do mar
vão ao teu encontro.
Quero em ti sentir
o teu reino
o caminho sereno
que transportas…
Sobraram janelas
fecharam-se portas
A flauta formou um arco-iris
Entra sereno o feiticeiro
o feiticeiro do fogo
Todos de pé ficaram
Será que o vilão escutará as ondas do mar?
Na bruma da madrugada
voam lentamente lençóis brancos…
João Mariano
sábado, outubro 28, 2006
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